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Meu amigo comprou um negócio pra casa dele

Meu amigo comprou um negócio pra casa dele e mandou entregar aqui. De modos que, depois duma aula divertida (minhas quintas-feiras têm um povo divertido demais), enquanto esperava a entrega piquei meio quilo de cebola o mais petitico que pude. Entreguei as cebolículas a uma colher de manteiga derretida na frigideirona pelando, fogo baixo. Lembro de quando Alexandre comprou essa frigideirona. Ela tem um nome especial, não sei mais qual. Estávamos na Liberdade com a Telinha e a Carina. Era um dia de festival, ruas lotadas, papeizinhos coloridos pendurados pra todo lado e agora me pergunto quantas e quantas vidas uma pessoa pode viver. Quantas, quantas. Enfim, vinte anos depois da morte do Alexandre, eis aqui a frigideira dele em muito melhor forma do que eu, resistindo ao fogo, à manteiga borbulhentinha, à cebola que derrete. Piquei dois maços de cebolinha, taquei lá também. Na tevê o Octávio Guedes faz um paralelo entre alguma coisa que o Lacerda fez um dia e alguma coisa que o governo ou alguém do governo tá fazendo agora, não sei bem, não tava prestando muita atenção e não entendo de Lacerda. Só gosto de ouvir o Octávio, a voz dele tão carioca, as piadas, a cara de quem sabe alguma coisa que eu não sei (no caso dele, várias e várias coisas). Tenho textos para mandar pro Paulo, devo textos pra Suzi e pra Pri, tenho muitas aulas pra preparar, mas tou aqui com a cebola que se transforma, planejando um curry apimentado que fará minha língua latejar e meu nariz arder.

(Depois duma terça-feira com Joana – apesar de divertida, minha menina das terças-feiras –, ouvindo espanhóis e seus sotaques, arrogância e graça, senti muita falta dos sanduíches com tudo dentro da mãe do Stra e a sensação que alguma comidas trazem: aquela que nos diz que tudo “vai ficar bem, fica gelo”. Faz muito tempo que não me sinto assim. Por isso o curry, acho.)

Um dia

Alguns relacionamentos são feito o filme de dobermans com o Fred Astaire, né. O velho tá lá, em forma, a mesma cara que aprendemos a amar ainda jovens, os catiorros são uma fofula, mas pelamordedeus, filme de dobermans com o Fred Astaire, né.

Então que o cara é amigo, tá tudo bem, compartilhamos outros amigos ou trabalho ou planos ou uma casa ou filhos e canções e memórias e a receita secreta de sorvete de nata da finada tia Abigail e, ainda assim, pelamordedeus.

Algo se perdeu ainda que o eco sobreviva, o que torna tudo mais triste.

Insuportavelmente mais triste.

outros fins de mundo

Por que fazemos o que fazemos? Dia após dia após dia. Por que continuo a insistir e a sonhar e a desenhar e a planejar um bolo? Por que continuo a? O que me impede de me tacar na frente de um ônibus em alta velocidade? – coisa na qual vivo pensando. O que me impede de ir a meia dúzia de psiquiatras diferentes e munida dum monte de receitas e uma garrafa de vodca acabar com tudo? O que me leva a comprar mais um livro, mais um OMO líquido, mais uma camisa que, eu sei, vai ficar ridícula no meu corpo disforme que pode passar meses, meses sem receber um abraço? Por que eu continuo? O que faz uma pessoa de passado horrendo e sem qualquer futuro, prosseguir? Para que e para onde são as perguntas que vêm a seguir. Mas o por quê paira sobre mim como um espírito ruim.

Escreva uma carta de amor.


Alguém me contou – e eu não corri atrás da confirmação, como faço com tudo em que desejo acreditar – que é possível mandar uma carta de amor para a Mona Lisa. O museu criou uma caixa postal só dela e você pode mandar poemas ruins, declarações malucas e cometer comparações estranhas do tipo dizer que os olhos dela são como com lagos profundos e misteriosos.
Você pode escrever cartas de amor para a Mona Lisa.
Ela não vai ler, claro.
O velho Leonardo também não.
Mas você terá tirado do peito aliterações de quinta categoria, versinhos do pé quebrado, tolas fantasias e desejos suspirosos. Dará ao seu amor um formato e até um endereço e poderá, enfim, voltar a arrumar suas gavetas e empilhar livros lá no escritório.
Tem quem se ofenda com declarações de amor, eu sei, mas a Mona Lisa parece ser mais gentil do que essa gente. Escreva uma carta de amor.

Em Roma como no amor

Donato, por mim, seria o Imperador da Porra Toda

O Bento hoje me ensinou que, em 146 a.C.,as coisas mudaram.
Roma voltou seus olhinhos cobiçosos para a Grécia e tomou Corinto. A gente manja o rolê: cavalos, navios, rapazes motivados e a promessa dum império brilhando como nunca depois de encher Cartago de porrada.
Roma, em Corinto, não fez o de sempre – matar líderes, matar quem tivesse de matar e, pro resto, estender a mão. Cês querem ser do nosso bonde? Claro que queremos, Roma.
Roma agia como age o amor, né, primeiro destruía, arrasava e queimava, depois convidava a ser ser cidadão, a ser parte da turma, a ser Roma.
Ao conquistar Corinto, porém, Roma agiu como em Cartago: arrasou a cidade e matou todo mundo. Ponto.
Ao mesmo tempo, dizer que não sobrou Corinto em lugar algum é ingenuidade: também como o amor, Corinto alterou Roma para sempre, vivendo nela para sempre. Destruída, Corinto fez com que Roma mudasse – conseguir o que desejamos altera o objeto do desejo, mas também a nós mesmos, mas também ao desejo.
Tomar Corinto engrandeceu Roma, tomar Corinto transformou Roma nalgo que não era mais Roma e que, para sempre, foi Roma.
Evidentemente liberei o Bento sete minutos mais cedo. Tamos aqui pra estudar inglês, não pra ficar escarafunchando meus ais, menino.

O passado sempre volta

– numa história muito mais linda do que a vida real, Dido foi a primeira rainha de Cartago. <3

Hoje, de maneira torpe e traiçoeira, comecei o lento processo de apresentar uma mente jovem e impressionável a Cartago. Sem que a família se dê conta, como boa professora esquerdista que sou, doutrinarei esse pobre menino até que ele aceite Anibal Barca como seu senhor e salvador, convertendo-se à verdadeira fé.
Quando a família menos esperar estará passando férias no norte da África, visitando ruínas de termas e palácios desabados e sendo também doutrinada.

***


Quando Roma botou a cara pra fora da água, Cartago já desfilava pelo Mediterrâneo anexando territórios, destruindo cidades, estabelecida numa bem engendrada e cruel e eficiente rede de influência e comércio. Cartago, herdeira da Fenícia de muitas maneiras – inclusive usando seu alfabeto, baseado no alfabeto egípcio e, mais tarde, lindamente roubado pelos romanos – era uma espécie de hub da antiguidade, reunindo, usando, modificando e transmitindo o que havia de grego, de egípcio, de hitita, de etrusco, de núbio, de persa e de todo o resto do mundo alcançável num lombo de cavalo, num barco a remo.
Roma que, crescida, queria os mesmo territórios, tesouros e brinquedos, destruiu Cartago pouco a pouco, uma batalha depois da outra, por muito tempo, comprando a consciência de generais, virando mercenários de lado, roubando e copiando – tábua por tábua – navios de guerra, roubando estratégias, espancando professores em porões até que, famintos e apavorados, eles lhes contassem segredos sobre famílias cartaginesas ricas e seus filhos e hábitos (professores fazem coisas horríveis por comida e vinho, eu digo).
Roma lutou nos campos de batalha e mares, mas também nos corredores e embaixadas e portos e zonas comerciais. Então, um dia, e é assim mesmo que se ergue um império (impérios são coisas terríveis, não se iluda), vencedora de muitas guerras, Roma entrou em Cartago, tacou fogo em tudo, matou e escravizou, pilhou e estuprou.
Cartago nunca se reergueu e Roma ainda brilharia por séculos, desfilando pelo Mediterrâneo anexando territórios, destruindo cidades, estabelecendo-se numa bem engendrada e cruel e eficiente rede de influência e comércio.
Nisso tudo, temos meu belo Aníbal, seu pai terrível e impressionante, sua família disfuncional, sedições de toda sorte e intrigas palacianas que se materializavam em corpos sem vida acumulados nas praias. Mas essa é outra história para outro dia.

Vem cá, meu bem

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Águas Passadas