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Quando

Éramos da mesma turma, ele e eu. Andamos juntos muito tempo. Ele me disse eu te amo duas vezes. Era um eu te amo em que não se devia acreditar, mas eu não sabia disso, então, bom, acreditei. Nas duas vezes. Faltava alguma coisa naquele casamento patético dele com a assistente mística, então ele me ligava. Ele me ligava para cantar em meu aniversário. Ele me ligava para falar de filmes e livros, de coisas, reclamar do trabalho e para cavucar as mil doenças gravíssimas que carregava consigo, para contar da viagem da mãe para a Itália, para me contar que tinha ido ao aniversário do amigo. Ele falava muito dele mesmo e eu fazia hum-hum no telefone. Uma vez eu mostrei o Chico Buarque mais lindo do mundo para ele e ele meio que gritou uma barata! e bateu o telefone na minha cara. Mas eu deixei ele me ligar de novo. E de novo. Ele me ligava sem marcar hora, sem perguntar se podia, como se eu estivesse à disposição dele. Eu estava à disposição dele. Depois de se separar da Maria Xixi, ele continuou me ligando. Faltava alguma coisa nele, com ou sem a Maria Xixi. Ele me mandava fotos do apartamento que estava arrumando para viver sozinho. Talvez, só talvez, o que faltava nele fosse eu. De qualquer maneira, ele me ligava mais vezes. Falava ainda mais de si, o assunto mais importante do mundo. Antes de morrer, a minha irmã, rainha de todos os reinos do drama, me disse que ele me destruiria. Ele me destruiu.

[no celular: Extreme Ways, Moby]

trecho deTodo o tempo em que permaneci de joelhos esperando por você, de Olimpia Caballer [no prelo]

Quando

Minha vida permanece a mesma. Nada mudou. Não tive filhos, não acabei a faculdade, não tive um grande amor, bebo para cacete e tenho subempregos estranhos. Ao mesmo tempo, nada permanece o mesmo e eu não reconheço coisa alguma. O tempo todo me sinto como se eu estivesse olhando um aquário. O mesmo aquário, as mesmas plantas, a mesma arca de tesouro de plástico vagabundo de onde saem bolhinhas, mas os peixes ficam andando de um lado para o outro, meio desesperados, meio surpresos por a vida deles ser aquele pesadelo pavoroso e daí que é sempre um aquário diferente.

*

Aquários são uma ideia imbecil de gente muito cruel.

Eu já tive um aquário. Não me orgulho.

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[no celular: Stand By Me – Music Travel Love (At Al Ain)]

trecho de Todo o tempo em que permaneci de joelhos esperando por você, de Olímpia Caballer [no prelo]

Quando

True Detective com a Foster. Resolvi recomeçar e, antes de ver a Foster, que tanto amo, voltei pra temporada 1. Se ele ainda falasse comigo, conversaríamos sobre. Boa poarte do nosso grupo já tinha visto a temporada 1 quando ele resolver assistir e comentou conosco. Naquele tempo ele não fingia que eu era especial pra ele, então não falou sobre a série especificamente comigo, mas prestei atenção na opinião dele. Gostei, achei muito inteligente. Ele tava naquela turma porque eu taquei ele lá. Ele fez aqueles amigos porque eu taquei ele lá. Hoje ele finge que eu não existo, mas fala com todos eles. A vida, né. Lembro que ele falou alguma coisa sobre a magreza do policial que não é o Woody e eu achei uma bela sacada. Não lembro mais o que foi.

*

Entrei com as quatro patas num trampo-roubada. Por que eu faço isso? Realmente eu não sei.

*

Ah, eu sei porque. Porque preciso pagar meus dentes.

*

Aqui ou chove sem parar ou o sol é um desgraçado. Não temos tempo de ser delicados nesta cidade, nem no clima.

*

Mas a minha irmã morreu, você sabe. É disso que se trata todo o resto. Ela morreu. Então eu compro gibis bem caros do Glauco, acendo umas velinhas e espero que o tempo passe para que eu também possa morrer.

*

Lixei três portas de madeira para a vizinha e ela me pagou muito bem. Virei uma dessas velhas gordas e grandes, de rabo de cabelo desleixado, mal-vestidas, que fazem esses trabalhos pesados mesmo sem qualquer preparo físico para isso. Na minha cabeça, peso cinquenta quilos e moro numa casa cheia de florzinhas e cortinas de renda. Na vida real, meu apartamento parece um galpão.

*

A gente não tem a neurose que quer, a minha mãe me dizia. Tem a neurose de que precisa.

[no celular: Against all odds, Phil Collins]

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trecho de

Todo o tempo em que permaneci de joelhos esperando por você, de Olímpia Caballer [no prelo]

Quando

Garoto devora universo. Que série sensacional.

*

Às vezes finjo que meu travesseiro é você. Abraço meu travesseiro e pergunto como foi o dia dele. Você não responde porque tem vergonha de mim e de falar comigo.

*

Piquei mais cebolinha, agora pra omeleta. Picar cebolinha não deixa de ser um talento.

*

Fui lembrada hoje, mais uma vez e sempre, de que aqui estou para pagar as contas. Eu esqueço, às vezes.

*

Me tornei o cara de quem ninguém gosta. O que não deixa de ser uma profecia autorrealizada.

.

[no celular: Look what you’ve done to me, Boz Scaggs]

trecho de

Todo o tempo em que permaneci de joelhos esperando por você, de Olímpia Caballer [no prelo]

Quando

Felicidade é não precisar ler sua opinião (imbecil, sempre) sobre o documentário da Julia.

*

O amanhã não vai se atrasar, Francis, mas quem dorme? Eu é que não.

*

Brasear pimentão, essa arte perdida. Mas o molho fica impecável.

*

Fiz tortinhas de aveia para o melhor molho de tomate do universo. Ficaram bonitas, ficaram deliciosas. As mais belas tortinhas solitárias da cidade.

*

Comprei um filtro solar fator 70, o que não é uma rima, mas é uma solução.

*

Gente que vem a São Paulo e não me procura, culpá-los, quem há de? Eu também não me procuraria.

Quando

[no celular: Um dueto, Francis Hime e Gal Costa]

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trecho de

Todo o tempo em que permaneci de joelhos esperando por você, de Olímpia Caballer [no prelo]

A chuva varrendo a rua

Choveu a noite toda e eu pensei em você. O que, além de patético, é duma estupidez alucinante, posto que tenho mais trabalho acumulado do que Deus no quinto dia e não posso ficar idealizando seus defeitos como uma moçoila do século XIX. Mas pensei em você. Ouvi a chuva. Separei conflitos armados entre gatos de diferentes facções. Bebi água como um peixe. Pintei duas caixas e pendurei mais uns negocinhos bonitos no meu armário. Do portão, espiei a chuva varrendo a rua, sacudindo as árvores. Fumei cigarros de cravo. Bebi um café de quinta categoria. Resmunguei em voz alta. Trabalhei, trabalhei demais. Pensei em você.

Vem cá, meu bem

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Águas Passadas