Pular para o conteúdo

Turquesa sobre bege

Vomitei de tristeza esse mês que passou. Fazia muitos, muitos anos que isso não acontecia. Dor, sabe?

*

A jornalista parece tão cansada. Usa uma blusa bege e um colarzão turquesa. O bege, pelo menos aquela tonalidade, rouba a força e o tom vibrante do turquesa. Ela desvaloriza a roupa, o colar e a si mesma com a combinação. Mas o cansaço dela reflete o meu. Estamos em meio ao apocalipse zumbi que, acabo de me dar conta, não vai passar nem depois que formos vacinados. Então, olha, beges roubando a vitalidade de nossos turquesas não é um problema tão grande assim quando paro para pensar.

*

Uma das músicas que mais adoro diz algo como “não entendo como eu podia viver antes”. Eu entendo. Demais, mesmo.

*

Este país celebra em suas ruas, ah-agora-qrr-coisa-é-morreu-de-coronga, lojas, clubes, gabinetes, almocinhos das amigas, peguei-e-fiquei-ótimos-pelamor-que-exagero, restaurantes (mas é a céu aberto, Fal), cinemas e lanchonetes os mais de 255 mil mortos por COVID. Se nós não estamos de parabéns, olha, quem estará.

*

O gato cinzento e marrom e branco muito velho quer colo. O. Tempo. Todo. E eu, que amo meu gato velho e cinzento e despenquento, não quero dar colo para ele. Não o tempo todo. Eu me sinto impaciente. Bruta. Cansada. Como se não tivesse nada para dar a quem quer que seja. Entende? Parece que dentro de mim há um imenso nada. Mas ele quer colo. Conversinha. Coçadinha na orelha. Quer que eu fale com ele. O. Tempo. Todo. Acontece que é velhinho e não está lá muito bem. Respiro fundo e fico com ele no colo e falo com ele e beijo a cabecinha dele e digo que ele é o gato mais amado do mundo. A mais pura verdade.

8 comentários em “Turquesa sobre bege”

  1. Eu achava que o pior era ver sumindo em mim tantas emoções e viver cheia de tristeza. Mas não era. Tô ficando oca, sem nada pra oferecer. Estou bem temerosa de não ser uma impressão desses dias mas uma mudança permanente. O apocalipse aqui dentro também.

  2. Falzita,
    vomitar de tristeza… eu não sabia que isso existia até acontecer comigo.
    O mundo à nossa volta nunca esteve tão duro. Sobreviver é o que dá.
    Um beijo muito grande pra você.

Deixe um comentário para Luciana Holanda Nepomuceno Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *