Pular para o conteúdo

Todo Mundo Adora Saturno (e-Book)

R$9,00

Saturno às vezes é uma pessoa, noutras é um lugar. A confusão entre um e outro é importante. Trata-se de pessoa incomum dotada de geografia misteriosa. Mais, é uma província eternamente separatista. No momento de ser alguém, então, Saturno fala de si, mas tão para dentro, que atinge o avesso, acabando por se referir a todo mundo. É uma nação sem terra. Isso e aquilo, e os soturnos preferem tal ou qual. A enunciação indireta é uma constante, a diferença é que nesse caso, produz-se um chiado, um ruído que tende, incerto, entre tons, quase como uma estação de rádio, sucessivamente achada e perdida, da qual se sabe, mais ou menos, a posição.

Para começar a falar, Saturno precisa se fazer nostálgico. Apesar de não ir a lugar nenhum, faz-se cúmplice do passado, de fantasmas, de como as pessoas pareciam se sentir antes etc. Essa inflexão é que o torna indireto, de saída. A nostalgia o impele a não arredar o pé do presente e a reproduzir, conforme o som, algumas expressões cotidianas. Não por etnografia ou linguística, mas para fazer graça com as palavras. Se começam a assumir gravidade, dispensa a instituição de um dicionário, que lhe renderia autoridade, e abandona os antigos termos como a quinquilharias. A nostalgia impõe que Saturno represente a si mesmo, e aos outros, e assim pode preservar sua intimidade na passagem dos dias. As coisas envelhecem mais rápido em Saturno, milhões de anos luz e há cinco minutos estão na mesma cristaleira. Há instantes, Saturno tinha tudo, todo o tempo do mundo, de repente, antes de se esconder na esquina virada, não tem mais o que perder, ou seu tempo acabou.

Tudo nele pode ser visto, porém, por mais que se mostre, é impossível vê-lo todo no mesmo momento. Os soturnos são intimistas. Eles obtêm intensidade graças ao fato de restarem sempre em alguma última sombra. Assim animam suas cores. Saturno, por sua vez, alimenta-se do charme insano das pessoas, que pode ser apenas imaginado por ele. Como saber, se não concede mais do que a realidade? Acaba por absolver a todos a quem suspeita suficientemente perversos, numa espécie de dúvida razoável, das séries de advogados, passantes às madrugadas.

Se observados os versos escritos em Saturno, notar-se-á que são comidos nas bordas, como feitos de frases encurtadas, bilhetes à onírica das relações. A sua gravidade, ao contrário do que acontece na Terra, não achata os versos, mas, curiosamente, comprime-os, como numa lógica de hipersensibilidade à saturação de tinta. Assim, os versos lá escritos são feitos por ‘pronto, já chega’ e ‘tá bom, agora outra linha’. Lá, a poesia é uma ampulheta em que os grãos são, agora sim, achatados antes de cair, isso não acontece em nenhum outro planeta do nosso sistema solar.

Parcelado em 12x sem cartão com Mercado Pago
Categoria:

Livro de poesias de Fal Azevedo

 

Avaliações

Não há avaliações ainda.

Seja o primeiro a avaliar “Todo Mundo Adora Saturno (e-Book)”

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *