diarinho terra de malboro
– Fal, cinco anos depois, ainda a mesma palhaçada?
– Pois, Paulão.
Ele traga o Free com desgosto, porque não é possível eu ser tão burra.
Diarinho de 10 de julho de 2021. Cinco anos.
– Fal, cinco anos depois, ainda a mesma palhaçada?
– Pois, Paulão.
Ele traga o Free com desgosto, porque não é possível eu ser tão burra.
Diarinho de 10 de julho de 2021. Cinco anos.
Trudia, ouvindo um amigo narrar suas aventuras, eu me dei conta do quão ridícula sou. Estou me comportando nas últimas seis, oito semanas, como aquelas senhoras patéticas dos filmes, as velhas ridículas que se derrubam pro lado do herói belo e jovem, cheio de graça e encantos. Que. Coisa. Pavorosa. Acabo de me sentir tão ridícula. Só agora?, vai perguntar você, cheio, cheio mesmo de razão, há tantos anos testemunha mais do que involuntária da minha constrangedora incapacidade de julgar minhas muitas limitações, o impossível ao meu alcance e, em certos casos, blink blink, o caráter alheio.
Pra você ver quão ridícula venho sendo, até eu me achei uma idiota.
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O bacana de manter um blog que ninguém lê é que posso choramingar. Quem vai ler? Pois é. A marca do meu fracasso e ruína: não tenho dinheiro para arrumar a geladeira. É simples assim. Vamos usar a geladeira de fora – que ainda bem está aí – porque dona Fabia não tem a menor capacidade de gerir a vida.
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Ah, e você achou que “ele tem uma namorada” (e eu me comportando como se isso realmente fizesse diferença) ou “o orçamento da geladeira está fora de questão” celebram o dia de hoje, para além do “pago duas internetes, a claro morreu há 4 dias e a vivo está a um pé do abismo”, saiba, não acabou: descobri que meu livro de comida com a Luciana não é um livro. Fiquei tão triste. Meu livro não é. A parte da Luciana é mais do que um livro, é um livro excelente. A minha parte é um imenso choro, bastante patético. Sequestrei a pouca literatura que produzia e me perdi em sentimentos errados, pela pessoa errada. Isso afetou como escrevo (para melhor) e a respeito do que escrevo (para muito, muito pior). O tema de toda minha literatura parece ser é: ele não me ama, ele não me quer. A dor, que poderia me transformar em uma escritora de profundidade, acabou por me transformar numa choramingas. Quando não se é bom na única coisa em que se é bom, o chão desaparece.
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A voz voltou, dei todas as aulas, darei todas as aulas, para sempre. A febre quase cedeu, orelhas razoáveis, febre oscilando ainda um cadim, mas nada parecido com a semana passada. Todas as aulas. Para sempre.
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Preciso de dez novos alunos para fechar as contas. Fechar as contas e arrumar a geladeira.
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Minha única solução literária, acho, (três sessões para, mais ou menos, lidar com isso – a de hoje foi um primor) é correr na direção da ficção sem olhar para trás. Fabia é uma narradora horrenda e assassina de talentinhos petiticos feito o meu. Lavinia, a narradora do Irineu, a moça do quadro perdido, a diletante que escreve sobre pintores como se entendesse alguma coisa: boas narradoras. Chega de Fabia e sua imensa dor. Parte da dor foi herdada pela Lavinia, mas a Lalá vai morrer lá pra março, então foda-se. O D dela se importará tanto quanto o meu e está, olha, tudo bem.
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Chega de cozinha. Vou comer sanduíche até depois do Natal.
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Tão bom resmungar sozinha. Olá, Drops. Eu tenho você. Só você, mas que diabos.
Tenho acompanhado o processo criativo do Max, que não quer que eu seja a preparadora de originais dele, mas quer que eu seja a preparadora de originais dele. É impressionante como a cabeça do Max funciona e a capacidade de pesquisa do cara.
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Acerca dos meus livros, um deles (que tem um nome lindo que ainda não quero dividir com ninguém) está virando uma coisa que eu não estava esperando na vida, ainda não, é cedo, é antes, é quase e eu preciso de tempo para lidar com. Esse negócio de trabalhar o dia todo para pagar as contas é prejudicial à escritura de livros, arrumação de casa, processo criativo e cicatrização. O Manual ainda tem tanto chão pela frente que às vezes me pergunto onde fui me meter. Asfalto está mais ou menos parado, texto a respeito do Klee completamente parado. O livro a respeito do autor modernista não está sequer esboçado.
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Abri um lindo rosé que chegou pelo correio. Achei que quando eu finalmente pudesse entrar pro clube do vinho já estaríamos bons amigos, que ele seria o cara a ser adicionado no site como “quem nos recomendou a você” e falaríamos a respeito das garrafas que chegam, mas claro que não. Claro que não.
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Perdi uma autora hoje, o que me é um golpe financeiro, mas, principalmente, um golpe de expectativa. Eu realmente achei que ergueríamos o livro dela juntas. Sei bem que não posso controlar o horário dos outros, se vão ou não se empenhar ou, caralhas, se têm ou não tem uma história para contar. Mas a decepção está aqui. É meio ridículo dizer isso, na superfície parece um autoelogio (é, sim, uma baita revelação de defeito), mas preciso mesmo aprender a gostar menos dos clientes e de seus livros suas promessas do que talvez, um dia, venha a ser um livro. Preciso, preciso. Para além de D e sua babaquice cruel, outras coisas nessa vida precisam, também, parar de me atingir. Posso até visualizar a SuperFal Peitos de Amianto, jamais atingida por coisa alguma, jamais dolorida, jamais em carne-vida, jamais tocada, jamais chorando no banho.
Frio, calor, sol, chuva, São Paulo nos transforma na vizinha-clichê, que bota as mãos nas cadeiras só para reclamar “e esse tempo, hein, menina?”. Descobri quem ama o homem que *** e estou surpresa, mas não tanto assim. Olha. Essa semana está interminável. Dormi lindamente nos últimos três dias, fiz uma lasanha muito decente e escrevi um conto que ficou sensacional. Vou abrir um vinho e sonhar com a Páscoa do ano-que-vem. #Diarinhoparticular
Conheci um homem chamado Sérgio que foi bem mau comigo.
Eu tinha uns vinte e cinco, talvez vinte seis anos.
Em dois encontros ele deu conta de chamar minha casa de esquisita, de me chamar de feia, de me chamar de estranha e de dizer que, o máximo que eu poderia almejar na vida, era ter gostadas as coisas que escrevia. Ele disse que eu jamais seria gostada.
Nunca trepamos, claro, quem treparia com alguém como eu, nunca mais nos vimos.
Não me lembro do sobrenome dele e nem como nos conhecemos. Não me lembro do rosto dele. Na verdade, não pensava no Sérgio há mais de vinte e cinco anos.
Mas ontem me lembrei exatamente do lugar em que ele estava sentado em nosso hiperestofado sofá amarelo e azul, na imensa sala da casa da rua Itápolis, quando me disse que talvez, talvez o que eu viesse a escrever na vida pudesse merecer alguma espécie de atenção. Até carinho.
Eu, nunca.
Ele disse em voz alta algo que eu sempre intuí. Não foi um vaticínio, hoje sei disso, foi só uma constatação, preciso corrigir o título ali de cima.
O dia de ontem nem precisava ter acontecido para que eu, novamente, fosse lembrada disso.
Mas aconteceu.