por Andréa Pontes
Só aceito Naza empurrando gente de escada
Dias longos. Semanas, então, nem se falam. O que fazer diante de problemas que parecem irremediáveis ou, de finais já carecas de conhecidos?
Por vezes, nada.
Em todas, deixar o tempo guiar.
Mas, é só janeiro. Na verdade, o tempo anda com pressa. O planeta, com suas chuvas, seus temporais, suas árvores caindo. O calor excessivo que produzimos. Sim, nós. É 2024 e ainda estamos reféns da energia elétrica, da estrutura das cidades. Ainda há gente sem colchões, antes mesmo dos temporais. Sem comida. Sem roupas. Ainda há os sem amor. E as histórias de casas não construídas, gente que ainda vive em construções condenadas. Gente que divide o pouco que dispõe.
O amor não chega para todos. E há os que gostam de distribuir não amor. Incrível, o ser humano. É preciso se manter forte em amar. Forte em resistir à pressa do caos. A listar e enfrentar cada item. Nada como um dia após o outro. A coisa esvai, como rio a caminho do mar. Sem querer esperar – mas, virá – o próximo revés.
Como é que se não espera pelo pior, não há como. É preciso. Para gerenciar, prever, tentar mudar o curso. Novas enchentes invadirão nossas vidas. É importante se preparar. A gente só não pode – porque desaprendemos – deixar de viver.
Hoje, a tevê mostrou Tony Ramos e Glória Pires, ícones artísticos. O diferencial deles é fazer o básico. Não se atrasam. Decoram os textos. São profissionais. Mas, vou além. No Brasil que mais queremos assistir, Tony come pão com ovo em rede nacional e adora. Glória pede a receita do bolo de aipim. É a vida sendo vivida. Na real.
Se os personagens das novelas pudessem sair das telas e dos palcos, eles certamente ririam muito de nós. Na verdade, assistimos a uma ficção e vivemos, nós, uma novela – a mais longa, a nossa vida. Sem cortes, edições. É preciso trabalho duro para ser ator. Tony Ramos explicou à Ana Maria o que é ler e reler e reler uma cena. Como é grande um texto de três páginas, rende muitos segundos. Como segurar a emoção, para já não sair chorando no início de uma cena, na qual você sabe que vai às lágrimas.
Só que a gente não recebe os textos do autor da nossa novela com antecedência. Quando Ele está de bom humor, nos presenteia com spoilers. Depois, a gente percebe que os sinais estavam todos lá. O autor da novela da vida não falha. É tão pesado, que recorremos às novelas criadas. O doido é que ela é baseada nas vidas de milhares de nós.
É confuso, mesmo. Tão confuso, que uma moça entrou em um reality e fez um reality particular dentro do programa. Uma vida que só ela enxerga, uma verdade só dela. Ela precisa de ajuda. E nós, também. Muitos de nós queremos ter um Tony Ramos todos os dias na nossa sala, dizendo como é bom pão com ovo. Ou pegar uma receita de bolo de aipim com a vizinha.
A gente só quer, só deveria viver e deixar os outros viverem.
Mas, a gente faz disso uma novela. Tony disse hoje que ao dizer para Janete Clair (outro ícone, imortal de novelas) se “não era muito coisa de novela”, Janete docilmente respondeu-lhe “não, isso é a vida”.