por Tiago Cordeiro
Lembra-se de quando você era criança e precisava pedir permissão a seus pais para fazer qualquer coisa? Se você foi como eu, durante boa parte da sua vida, nem mesmo gostava de andar sozinho porque batia o medo de se perder ou falar alguma coisa errada. Ser imigrante é parecido, mas piora um pouquinho quando você também é escritor.
Escritores têm uma relação especial com a língua. Um certo orgulho bobo de fingir que a palavra nos pertence quando normalmente é o contrário – inclusive, algumas palavras têm uma relação abusiva conosco, mas é assunto para outro texto.
Acredito que essa empáfia venha daquela sensação de que não somos mais crianças e sabemos nos virar em qualquer situação, desde que dependa de discurso ou escrita. Se mudamos de país esse orgulho sai de cena para relembrarmos como é não saber verbalizar qualquer angústia. Dessa vez nem podemos chorar apesar do choro ser universal.
É uma espécie de lembrança dos tempos em que caíamos para aprender a andar. Não importa o quanto você estude a língua, leva-se tempo para entender tudo, se é que isso é possível. Uma ida a um restaurante e você pode terminar com um litrão de água mineral quando queria apenas uma água com gás. Tome cuidado quando lhe perguntarem sobre os acompanhamentos.
Clarice Lispector dizia que perder-se também é caminho. Vaguear pelo mundo é uma oportunidade de viver experiências sobre as quais você só poderia ler a respeito. Ninguém espera ser vítima de xenofobia, mas isso acontece com todas as minorias ao redor do mundo, inclusive no Brasil.
Há quem diga que toda história é sobre alguém que volta ou quer voltar para casa. Se cada crônica ou conto que eu escrever na vida tiver isto implícito espero que em algum asterisco esteja claro que a minha casa pode ser o Canadá ou o Méier onde passei boa parte da minha vida. Pode ser qualquer lugar desde que eu consiga contar histórias que alguém queira ler. O resto é só neve na janela.
Tiago Cordeiro é escritor de Sombras & Fadas, roteirista, jornalista e blogueiro. Não necessariamente nessa ordem, mas quase sempre o tempo todo. Atualmente, vive em Winnipeg, Canadá.