por Andréa Pontes
Um almoço sem pressa; as memórias vêm e vão. As memórias, que construímos todos os dias, sem saber se estarão vívidas em nossa mente no fim da vida. O fim da vida. A gente nasce sabendo que vai chegar, mas nos esquecemos disso. Engraçado, quando temos mais a mente produtiva, desaparece a informação mais importante – de que um dia, essa vida vai acabar.
Há os que querem viver com muita intensidade. Há os que deixam as coisas passarem. Extremos nunca são bons. Em busca de referências, encontro Zeca Pagodinho. São 40 anos de carreira, 65 anos de idade. E, as frases que mais saem da boca desse ídolo são a de nunca fazer planos, deixar a vida ser levada. Tem tanta convicção nisso, que esse pensamento virou letra de samba famoso…” deixa a vida me levar, vida, leva eu”.
Não, isso não é desleixo com a vida. Pelo contrário. É saber lidar com ela. Deixá-la acontecer. Sem controles, sem querer impedir ou detê-la. Isso te leva a um estar presente a cada minuto. Algo impensável aos mais ansiosos, aos que querem o topo o quanto antes, aos que se frustram porque aos 30 anos não se casaram, não têm filhos, não são presidentes de empresas. Como se fosse algo mandatório e a felicidade só existisse nessa combinação.
Somos livres para ir aonde quisermos. Mas, ficamos presos ao que é pré-estabelecido. É aí que a felicidade, aquela, que tanto perseguimos, como o pomo de ouro no jogo de quadribol, do Harry Potter. Dá uma busca na Internet, que mesmo não gostando do bruxinho, você vai entender.
A felicidade está em uma conversa na porta de casa, com a frase que mais você está precisando ouvir: ‘o que não tem remédio, remediado está’. Frase da semana, do mês, do ano. Quantas vezes queimamos os neurônios e a coisa toda se resolve, na sapiência de Zeca Pagodinho. Levando a vida. Fazendo o que é possível.
A felicidade está em uma conversa sobre o amor pelos cachorros. Em ver o filho domar o medo do dentista. Quem a gente gosta estar bem. Aquela cena da novela de tirar o fôlego e – como dizemos aos amigos, ‘não dá nem tempo de fazer um xixi’. A entrega de um trabalho de curso. As contas pagas – como tiram o sono quando não estão. ‘Pagar’ aquele treino e jogar endorfina no organismo.
Andamos tão nervosos, que perdemos tais momentos. Eles não entram na memória. E se perdem, por aí. Na escola Pagodinho, não é o caso de quebrar um recorde mundial. É exatamente estar atento, atenta e viver.
“Estamos muito sem amor”, diz Zeca em entrevista de tevê. Estamos nos esquecendo de viver antes de perder a memória, Zeca.