by Fal Azevedo
Em Efrata de Belém, me perdoem a rima ruim, ninguém era de ninguém. Estava todo mundo acolá, vivendo em grande iniquidade. Salsinha sendo picada sobre a tábua dos dez mandamentos, a arca da aliança cheia de manta lá no quarto da vó, os meninos do 81 tirando um som nas cornetas de Jericó, a Torá servindo de calço para mesa de ping-pongue e a malandragem posta em sossego. Mapeando a palhaçada, Deus, com seu ego de bebê gigante, sentiu-se desaplaudido e resolveu fazer geral pagar o credicarma. Jogou foi fome nos calhordas.
Tempos duros se instalaram, a mão invisível do mercado só dava pescotapa na nuca dos ímpios, o ministro da economia cortando tudo quanto era bolsa de doutorado, o feijão quase oito reais o pacote.
Vai daí que Elimeleque, odiando esse negócio de viver que nem pobre, garrou a mulher dele e seus dois fios e, chamando a Granero, foi cantar noutra freguesia.
Ou seja, em Moabe. Onde moravam, quem diria, os moabitas. Rutinha, era tipo princesa deles. Mais que princesa, tchutchuca.
Fofa que só, Rutinha logo fez amizade com os vizinhos judeus sem maldade no coração – ela era meio adolescente rebelde, reclamava de como viviam os pais, achava que aquele negócio de palácio e três refeições por dia era coisa de burguês.
Por isso, quando ela aceitou o pedido de casamento do menino da casa ao lado, os pais dela suspiraram fundo e toparam. Antes isso do que um piercing no umbigo.
Anos depois, quando o velho e seus dois filhos morreram, a mulher de Meleca, Naomi, viu uma excelente oportunidade de se livrar das noras e viver la vida loca noutras paragens. Ela disse para as meninas que ia voltar para sua terra natal, mas que as noras deveriam voltar para casa dos pais, pois em Belém o sistema era bruto. Uma das noras não se manifestou, devia de tar louca para contrair segundas núpcias com o dono da lotérica, mas Rutinha, gente finíssima, taca pra cima da véia o já manjado teu Deus é o meu Deus, tua tenda é a minha tenda, tamos juntas, BFFs forever.
Rute 1:16
A véia e Rutinha encararam meses de estrada sujando as vestes de pó e pagando dezesseis pila no misto quente do Graal. Um dia, enfim, chegaram.
Rutinha, depois de acomodar a véia no Motel Meia é Meia, saiu em busca duns objetos comestíveis, shampoo e, quem sabe, um vinho rose em lata.
Esbarrou em Boaz, um considerado rico. Muito, muito rico. Boaz ficou todo animado pra cima de Rutinha e encheu ela de palavrinhas malacas em hebraico, além de vários lanches.
Rutinha voltou pra casa toda feliz e contou o ocorrido para Naomi que já morou na jogada: Boaz era primo do finado Meleca. Israel, gente, é um ovo.
Nos meses seguintes, Rutinha deixou Boaz pagar um Big MacabeuCheese pra ela, noivaram, ele fez dela uma mulher honesta antes de conhecê-la biblicamente (perdão, leitor), fizeram uma suíte pra Naomi na edícula, tiveram um bebezinho que viria a ser, vejam vocês, pai de Jessé (vida que vem e que vaaaaaaaaai, VEM GENT) e avô de David (já falei que Israel é um ovo?).
Moral da história: nem sempre coisas boas acontecem para pessoas boas, mas às vezes, olha, acontecem.