As pessoas me contratam porque não conseguem escrever. Querem escrever melhor. Querem escrever e não encontram o caminho. Querem escrever e querem um novo caminho. Pessoas me contratam, pagam minhas contas, os remédios da minha mãe, a ração do meu gatinho de vinte anos, “Fal, preciso escrever/quero escrever um livro, uma tese, uma carta de amor”, para que eu as ajude a encontrar um meato particular, suas próprias palavras, a mina de sua fonte pessoal. Ah, e eu as ajudo. Gosto de pensar que as ajudo. Eu as ajudo para que encontrem em suas próprias palavras, não as minhas. Suas próprias histórias, não as minhas. Para que descubram como dar voz à própria voz, por mais estranha que seja essa frase. Ajudo quem me procura e juntos encontramos a trilha para que sigam, primeiro comigo, depois sozinhos. Este é meu cotidiano há muito tempo. Agora, eu que faço da minha vida tomar os outros pela mão e acompanhá-los ao longo do sendero das palavras, não tenho conseguido encontrar meu carreador. As palavras têm me fugido, escapado, traído, recusado. Eu queria colocar a culpa em você. Queria dizer que sem você, sem palavras, sem ter o que dizer, sem tema, sem mote. Mas seria mentira, seria injustiça. As palavras não me vêm e a culpa é minha. As palavras não me veem e a culpa é de ninguém. Talvez tenham outros galhos para pousar. Talvez eu tenha usado a minha cota delas nessa vida, desperdiçado algumas, deixado que rolassem pelo balcão e, por isso, os privilégios me tenham sido tirados. Talvez as palavras, as minhas, voltem assobiando na próxima semana ou na outra, como quem não quer nada, colarinho sujo de batom, marmita debaixo do braço. Talvez. Um dia eu lhe disse que voltar para nós é da natureza das palavras. Falei para acalmá -lo, falei porque acreditava nisso, falei porque amo você quando não deveria e quero que você se sinta bem. Agora digo a mesma coisa a mim mesma e torço para ter razão.
Nossa, que lindo, que lindo
Obrigada, querida!