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Imagine

por Andréa Pontes

No dia do professor, por mais livros e menos armas

Vamos começar a semana com a segunda guerra em pleno século XXI em curso. Israel em conflito com o Hamas, enquanto há a guerra entre Ucrânia e Rússia. O dia da padroeira do Brasil – Nossa Senhora de Aparecida – ficou abafado. As imagens da basílica ou do Círio de Nazaré foram tímidas. O horror da fome, da falta de estrutura nos hospitais aos palestinos em Gaza, a forma como os terroristas do Hamas sequestraram, mataram israelenses – idosos, crianças, bebês, mulheres – é assustador. Em meio a isso, cenas de um Brasil ágil em resgatar brasileiros – a vida acima da polarização – algo que dá muita esperança de humanidade possível.

Não há como eu não lembrar de Eduardo Galeano e o livro que marcou minha adolescência –  As veias abertas da América Latina. O escritor uruguaio lembra o horror da bomba de Hiroshima, durante a Segunda Guerra Mundial, para descrever a América Latina. “São secretas as matanças de miséria na América Latina. A cada ano, silenciosamente, (…) explodem três bombas de Hiroshima sobre esses povos que têm o costume de sofrer de boca calada”.  Não precisamos voltar à Idade Média ou até mesmo ao homem de Neandertal para concluir: nós nunca paramos de nos matar.

Uma criança de 11 anos, Bader Monir Bader, está no grupo de brasileiros que espera a qualquer momento a autorização do Egito, para finalmente pegar o avião presidencial e voltar ao solo brasileiro. Bader, quando esteve abrigado em uma escola, ao norte de Gaza, disse que estava muito feliz de estar ali, porque “nessa escola eu me senti com muita segurança porque aqui a gente não pode morrer. Aqui o chão é limpo, tudo é limpo”. Torcendo muito por Bader e as outras mais de dez crianças que estão com ele. Infelizmente, essas cenas não vão sair das mentes deles. Mas, que possam ter um futuro melhor.

Fico a pensar o que é ser criado em uma guerra – seja ela urbana, em comunidades do Brasil que sequer contam com banheiros, saneamento básico. Seja ela em uma tribo indígena, ameaçada constantemente por garimpeiros. Seja agora, em Gaza, ou nas cidades ucranianas, com todo o tipo de violência visível. Seja na África. Violências difíceis de serem pronunciadas. A fome, a falta de assistência médica – pausa para os médicos que estão em Gaza, nesse momento, sem luz, sem água, e fazendo o impossível para cuidar de feridos, de recém-nascidos, de gente que precisa urgentemente de uma cirurgia. Não há adjetivo para dizer o que esses profissionais estão fazendo para salvar vidas, em um lugar que cheira à morte.

Diz uma lenda que há uma forma eficaz de matar uma floresta sem utilizar um único machado. Basta dizer constantemente às árvores que elas estão condenadas, sem futuro, sem saída. É doloroso, mas é o que milhares de crianças palestinas, israelenses, ucranianas e tantas outras, à margem de uma vida mais digna e segura, estão recebendo do mundo. Mensagens por meios cruéis e violentos.

Do sofá de nossas casas, o que podemos fazer? Acredito que a informação correta é a primeira coisa. Entender o que está ocorrendo e não abrir a boca sem ter a certeza do que está falando. Desinformação mata. Ampliar o nosso olhar é outro movimento importante. Tem muita gente pertinho de nós tratada como invisível. 

Imagine que não há países. Não é difícil de fazer. Nada pelo que matar ou morrer. Imagine todas as pessoas compartilhando o mundo. Eu me pergunto se você pode. Não há necessidade de ganância ou fome.

Quem diz isso não sou eu. É John Lennon. Há 52 anos.

Imagine.

2 comentários em “Imagine”

  1. Acabei de ler um conto de Tchekhov, Um caso clínico, em que um médico é chamado para atender uma jovem herdeira, que está doente. A doença dela, conclui o médico, é sofrer “de capitalismo iniciante”. Ela sente as injustiças, as doenças, a fome, a ignorância e sabe – sem saber – que ela é que promove isso. O médico também está sensível às mazelas que vê e ouve. Lá, na Rússia, de 1898, a personagem diz: ” Nossa geração dorme mal, ficamos angústiados, conversamos muito e estamos sempre procurando descobrir se temos ou não razão. No entanto, para nossos filhos ou netos, estará resolvida essa questão de se ter ou não razão. Isso lhes aparecerá mais claro. A vida será boa daqui a uns cinquenta anos, pena que não a alcançaremos. Seria interessante ver um pouco.” Entre a ficção e a realidade, estamos nós, aqui, século XXI, vendo que a guerra prospéra aqueles que querem mais e mais. Não é nada interessante, dormimos mal e estamos angustiados. Sua reflexão é importante, tão importante quanto um conto de Tchekhov. Obrigada!

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