
Falar com D. me deixava eufórica e triste, a desatenção (que não, não era uma fase, foram anos e anos) acabava comigo, fotos me deixavam triste e a foto derradeira, de repente, mostrou o que ele me diz há cinco anos: querida, não estou aí pra isso e, veja bem, de todas as maneiras possíveis isso lhe foi dito. Qual a parte que você não entendeu?
Eu entendi, mas não entendi, até entender. Sempre uma educação.
Estou muito mais triste do que nos últimos cinco anos juntinhos e acumulados. Ontem chorei até dormir e sonhei com D. e o apartamento de D.
Acordei assustada, às duas e meia da madrugada e fui dobrar roupas e devolver livros às estantes, me sentindo um inseto repelente. Fiz chá, fiz outro chá, não chorei, lavei a cabeça, não chorei. Fiz um café, bem lentamente, sentindo o calor do vapor, o cheiro de cada centímetro cúbico do pó escuro. Um dia eu fiz um áudio lindo para D. sobre isso, sobre as manhãs e seus vagares. Nenhuma resposta. Lembrei disso enquanto respirava meu café na casa em silêncio. Eu enchi o saco da criatura que não me queria por perto. Deve estar aliviado. Eu, sinceramente, me colocando no lugar dele, também estaria.
*
Na prática, a vida realmente não muda, e é nisso que eu devo me concentrar: ele não me lia, vai continuar não lendo. Não perguntava se eu tinha melhorado, vai continuar não perguntando. Não me queria por perto, vai continuar não querendo. Jamais encararia a Dutra por mim etc. etc. etc.
A diferença é que eu, que sempre soube disso, agora sei mesmo-realmente-para-caralho disso.
*
Acho que, apesar da imensa dor, vai sarar. Se o Drexler não me mentiu, vai sarar. Alguma hora, de algum jeito, vai sarar. O Drexler jamais me mentiria. Acho.
Vai sarar, eu tenho que acreditar nisso pra fazer o esforço de respirar. Uso os dias de um “antes” pra me convencer. “Antes” eu existia e até ficava feliz. Se “antes”, também “depois”. Claro que eu reconheço que minha lógica é falha, não tem depois para quem carrega uma ferida fatal, mas faço de conta que é arranhão. Acredito em você, acredito no Drexler, acredito nos roteiristas da série adolescente sobre troca de crianças na maternidade. Vai passar. E, aqui comigo, ficarão uma memória confusa e textos dolorosamente ruins.
Menina, textos ruins: eu que cuido desse departamento.